22 Fevereiro 2020 - 11:31

Da roça ao Mundial: em um ano, promessa do atletismo dá volta por cima

Divulgação
Corredor com a premiação da 11ª posição da São Silvestre

Melhor brasileiro da última edição da Corrida de São Silvestre, em dezembro do ano passado, com o 11º lugar. Vencedor da Copa Brasil de Cross Country em janeiro. Campeão da Meia Maratona Internacional de São Paulo em fevereiro (transmitida ao vivo pela TV Brasil) com direito a índice atingido para o Mundial da prova, de 21 quilômetros. E, há uma semana, convocado oficialmente para a competição, marcada para 29 de março em Gydnia (Polônia), superando a concorrência, por exemplo, de Giovani dos Santos, um veterano de provas de fundo.

Com toda essa introdução, seria de se esperar que Daniel Ferreira do Nascimento apontasse esses três meses como os melhores da carreira. Mas, não. O jovem de Paraguaçu Paulista, cidade a mais de 420 quilômetros de São Paulo, não deixa a boa fase o influenciar. "Mesmo com excelentes resultados, vou passo a passo, acreditando, visando o futuro. Já tive outros bons momentos, não só como esse. É muito trabalho, determinação e foco. Passo a passo, as coisas vão acontecendo", afirmou.

Trabalho, determinação, foco, passo a passo. Palavras que Daniel repetiu bastante na entrevista à Agência Brasil. Não é um discurso pronto. Trata-se de um recomeço para o jovem de 21 anos, oito dedicados ao esporte, mas que ficou quase que a temporada passada inteira parado. E se a última São Silvestre o colocou nos holofotes do atletismo, a anterior (2018) levou-o a repensar o futuro. "Eu tive dores no tendão de aquiles, abandonei a prova. Depois de lá, desisti do esporte e retornei para minha casa, pensando em trabalhar", contou.

Daniel, então, trocou a rotina de treinos pela da roça, com a família. "Voltei a cortar cana", lembrou. "Eu já acordava cedo (quando atleta), passei a levantar ainda mais cedo, umas quatro horas da manhã. Ficava quase oito horas no trabalho e só depois voltava para casa e descansava para o outro dia", completou.

Poderia ser o fim precoce de uma carreira que surgiu promissora, com medalhas, pódios e recordes nacionais e sul-americanos quebrados na base em provas de resistência. Mas, coube a um companheiro de trabalho na roça dar um empurrãozinho para a vida esportiva de Daniel recomeçar. "Ele me conhecia de atleta, pedia para dar uma corridinha de lá para cá. Ele ficava observando e dizia: 'Volta a correr, aqui você não vai ter futuro'. Eu agradeço essa pessoa até hoje, assim surgiu a motivação, fez grande diferença na minha vida", disse.

Recomeço em Bauru

"O acompanhávamos desde 2013, quando começou em Paraguaçu, com os professores Evandro e Regiane Teixeira, depois na Orcampi, em Campinas (SP), com o Alex Sandro Lopes", recordou à Agência Brasil o atual técnico de Daniel, Neto Gonçalves, da Associação Bauruense de Desportos Aquáticos (ABDA).

A instituição, como o nome indica, é de Bauru (SP), a cerca de 180 quilômetros de Paraguaçu Paulista. A parceria entre Neto e Daniel começou há nove meses. "Ele queria voltar a treinar, a competir e pediu uma chance para retornar ao esporte. A gente sentou, conversou, apresentei nosso projeto e equipe", contou o treinador.

Como em 2014, quando se mudou para Campinas, Daniel outra vez saiu de casa em busca do sonho no esporte. E, apesar da distância, com o apoio incondicional da mãe, Valdirene. "Ela sempre me incentivou, independente do que eu almejasse, na corrida ou no futebol", destacou o jovem, que, antes de se aventurar no atletismo, tentou ser lateral. "Ela é evangélica, e tem uma frase marcante da Bíblia que ela sempre me diz: 'Filho meu, obedece à orientação de teu pai e não abandones o ensino de tua mãe' [Provérbios 6.20]", emendou.

A rotina em Bauru é intensa, com treinamento em seis dos sete dias da semana, algumas vezes em duas sessões. "Usamos a pista para treinos intervalados e ele também faz algumas atividades em bosques e estradas de terra. Há, ainda, acompanhamento de uma equipe multidisciplinar com nutricionista, médico, psicólogo, fisioterapeuta. E abordamos bastante a questão do descanso, que é importantíssimo", declarou Neto.

Alô, 2024!

A curto prazo, o foco do trabalho é o Mundial da Polônia, para o qual o próprio Daniel não esperava a convocação, mesmo com o índice. Olimpíada? Talvez, daqui a quatro anos, em Paris, na França. "Agora, quero chegar o mais próximo possível do índice [em provas olímpicas de fundo], mas estou visando 2024. Pode ser na maratona, nos cinco mil metros, nos dois mil. Vai depender do planejamento", projetou o atleta.

"Estamos focando bastante na melhora dele em provas de pista, como os cinco e dez mil metros. Todo atleta tem o sonho olímpico e vamos trabalhar para isso, mas pensamos a longo prazo. É um atleta jovem. Temos de ter cuidado [no trabalho] para que ele renda o máximo possível", complementou Neto.

Mas não é só nas pistas que Daniel deposita seus sonhos: "A carreira de atleta passa rápido. Penso também em estudar Educação Física. Ou mesmo me preparar para entrevistas que terão futuramente [risos]. Até mesmo estudar inglês e mostrar minha história não só para incentivar pessoas do Brasil, mas do mundo inteiro, que saibam dos momentos difíceis que tive que superar para obter excelentes resultados".

Brasil no Mundial

Além de Daniel, o Brasil será representado no Mundial de Meia Maratona por mais quatro atletas: Ederson Vilela Pereira (ouro nos 10 mil metros nos Jogos Pan-Americanos de Lima, no Peru), Gilmar Silvestre Lopes (hexacampeão da Copa Brasil de Cross Country), Valdilene dos Santos Silva e Andreia Aparecida Hessel, respectivamente 6ª e 8ª na maratona feminina do Pan. A previsão, segundo a Confederação Brasileira de Atletismo (CBAt), é que a delegação embarque para a Polônia no dia 25 de março.

por Agência Brasil

Comentários comentar agora ❯