A Raiz do Oiteiro e sua trajetória
Enedina Vieira da Silva e Cleide Mônica Alves são as mulheres com referências brilhantes em relação ao bairro Senhor do Bonfim, o Oiteiro. Estas mulheres me receberam em suas residências para uma prosa leve e relevante sobre a história do seu bairro. Aquele bairro que recebeu o apelido de “Oiteiro” por se encontrar num ponto alto da região próxima ao centro do Penedo-AL.
Bairro Senhor do Bonfim - Oiteiro
De significativa importância quilombola, este bairro ainda não tinha recebido uma descrição mais detalhada sobre sua origem, de forma a tornar público informações conhecidas apenas por poucos moradores. Até que o blog Olhar do Turismo resolveu dar algumas voltas pela região, “curiando” coisas que não são alheias à história do nosso município e têm importância para todos.
Praça do Oiteiro
Há quem diga que o Oiteiro é o segundo bairro mais importante do Penedo, e disso não tenho dúvida. Até porque, era lá que os escravos encontravam refúgio quando sofriam maus-tratos por parte de seus “senhores”. Era o lugar onde os quilombolas cultivavam arroz e levavam os pescados do rio São Francisco. Naqueles tempos era comum entrar na dança e se embalar com os ritmos do batuque que alegravam suas vidas, fazendo-os esquecer do sofrimento desnecessário de uma cultura violenta.
Vista do Cristo - Oiteiro
Como a vegetação era alta e o local isolado, ficava fácil camuflar suas casas de barro e poder desenvolver uma comunidade que veio a gerar muitos descendentes ao longo dos anos. Informação essa que, aparentemente, não trouxe muito orgulho para as pessoas que se envergonham de suas origens. Como não se orgulhar de ser origem de um povo que lutou muito pela sua dignidade? Interessante mesmo é não ser racista.
Clube do Ferro, salão utiizado para reunião de jogares e pequenos eventos da comunidade
E com o passar dos anos a história só aumentou e nos deixou uma herança cultural e histórica. Agora o Oiteiro conta com a destacada estátua do Cristo, construída na década de 80 e abençoada por Frei Damião. O que para alguns a estátua está de costas para o bairro, na verdade o sentido é que o Cristo está de braços abertos para receber quem visita esta comunidade. A lógica pode ir além; somente pelo fato do Cristo estar instalado naquela região, isso já é um prestígio.
Localização do Cristo no Oiteiro
Dona Enedina Vieira da Silva é conhecida no bairro como dona Necíla. Ela tem 86 anos de idade e participou da construção da igreja Senhor do Bonfim. A mesma me contou que uma paixão avassaladora pela fé, foi o motivo pelo qual os moradores se reuniram para construir a igreja às custas do suor que pingava desde as caminhadas em busca de contribuições ao transporte de materiais carregados por homens e mulheres.
Igreja Senhor do Bonfim - Oiteiro
Conta-se que a antiga capela localizava-se naquele espaço entre as casas
Os trabalhos começavam no sábado à noite e terminavam no domingo, pois, de segunda à sábado as pessoas trabalhavam para a subsistência da família e, por este motivo, foram necessários 4 anos para que a construção da igreja fosse concluída. Daí, as missas deixaram de acontecer na pequena capela do Senhor do Bonfim que abrigava apenas 30 pessoas. Com isso, podemos observar que tratou-se de uma mobilização social em prol da fé, coisa muito difícil de se ver hoje em dia. Até parece que, de uns tempos para cá, a fé mudou (e os valores também).
Dona Necíla mostrando uma de suas antigas moedas
A dona Necíla trabalhou como tecelã durante quarenta anos na fábrica Peixoto Gonçalves, localizada no município de Neópolis (SE) e mais cinco anos na fábrica Penedense, localizada no Barro Vermelho, aqui no Penedo (também como tecelã). Ela contou que os tempos eram difíceis, lembrando que, como naquela época não existia água encanada e nem luz elétrica, era necessário buscar água de uma fonte que fica na parte baixa do bairro.
Dona Necíla mostrando seu álbum de fotos onde participou das manifestações folclóricas do Penedo
Quando perguntei sobre o lazer das pessoas naquele tempo, dona Necíla contou que dançou muito “quilombo”, segundo ela, as danças eram de “nego nagô” e “d’angola”, embaladas por uma batucada, e que havia um chafariz onde se pagava um tostão (moeda da época) para tomar banho. Lembrou que ela é a única pessoa viva que ajudou na construção da Igreja Senhor do Bomfin, algo que me faz pensar que ela merece uma placa em sua homenagem dentro (ou fora) da igreja.
A fonte de onde era retirada a água, está na parte onde se vê vegetação
Esta é a água que vem da fonte e deságua no rio São Francisco
Já a dona Cleide é a responsável por tornar o bairro do Oiteiro reconhecido como comunidade quilombola, pois a mesma, com recursos próprios, lidou com os processos burocráticos e conseguiu atingir o que almejava no ano de 2006, contribuindo de uma forma bastante significativa para a vida das pessoas que hoje usufruem dos benefícios oriundos do governo.
Estátua fazendo alusão a uma quilombola transportando água da fonte
Dona Cleide contou que já foi presidente do bairro e que é descendente de quilombola, daí vem a motivação em trabalhar a favor da cultura local. Além de saber e valorizar suas origens, dona Cleide disse que no bairro existia a única escola rural do município chamada Escola Professor Leônidas Sousa, era lá que, tempos atrás, uma pessoa com conhecimento de primário já poderia dar aula como professora e assim alfabetizar as crianças. Infelizmente o prédio da escola encontra-se em ruínas, mas acredito que muitos dos que passaram por lá conseguem se lembrar das coisas que vivenciaram.
Ruína da Escola Professor Leônidas Sousa
As mulheres que foram mencionadas aqui têm a cultura quilombola enraizada em suas memórias de um jeito peculiar e inspirador. Espera-se que no Oiteiro sejam criadas ações para nos apresentar suas manifestações quilombolas.
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