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Suzy Maurício

Suzy Maurício

Psicóloga Clínica com atuação na cidade de Arapiraca

Postado em 27/07/2009 19:15

Liberdade: da subjetividade ao pleno direito

 No ano em que comemoramos 120 anos de abolição da escravatura, 18 anos de ECA, 20 anos de democracia plena e 60 anos da declaração universal dos direitos humanos, é lamentável descobrir que ainda estamos muito aquém do que rege o artigo primeiro da declaração: “livres e iguais nascem todos os seres humanos”. Em 14 de julho, dia mundial da liberdade, esta é (re) vista sob o ponto de vista individual e coletivo, considerando os pressupostos existenciais, filosóficos, éticos, e de direito. Os direitos à segurança, à não ser alvo de violência, à defesa, ‘a dignidade e honra pessoal, ‘a participação política, ‘a ter qualquer pensamento filosófico, religioso, ‘a educação, à saúde e à moradia não são concedidos de forma plena, para tanto é preciso concluir o circuito de igualdade entre os povos. Em tempos de violência e injustiça social, onde liberdade confunde-se com dominação e o poder parece ser oligárquico, assistir aos noticiários que tratam das buscas e apreensões de majestades “intocáveis”, faz-nos acreditar que os ternos são de “vidro” e que somos iguais perante a lei, ao menos à primeira vista.

Sartre refere que “o homem é antes de tudo livre”, a liberdade é segundo Descartes “autonomia e vontade”, e constitui a condição dos comportamentos humanos voluntários. Ser livre, portanto, é ser autônomo, dar a si mesmo as regras a serem seguidas, ter permissão e licença, sendo um pressuposto para a responsabilidade. Não podemos fazer escolhas e agir indiscriminadamente, há limites e este acaba quando começa o do outro. Cada um de nós é um sujeito de escolhas, e também de conscientização e deveres. As más escolhas refletem na privação do direito à liberdade, por dolo ou culpa as penas são aplicadas. O ato delituoso (o que, como ocorreu) vem se deslocando da abordagem concreta dos atos observáveis para a dimensão interna, subjetiva dos criminosos, pensa-se sobre o risco que x ou y venha a infringir a lei, e pensa-se também nele, pessoa, e nos humanos direitos. Vivemos um momento de grandes mazelas sociais: individuais e comunitárias. Alagoas é o único estado brasileiro a ter o Psicólogo na Defensoria Pública, temos direito também a uma escuta especializada, a (re) costurar nossa história e optar por um novo começo, a isto dá-se o nome de reabilitação psicossocial.

“Liberdade, essa palavra que o sonho humano alimenta, que não há ninguém que não entenda”. Nem sempre este ideal é tão romântico como nas palavras de Cecília Meireles. Há muita gente privada de liberdade sem ter culpa, há criminosos que estão livres, isto só reflete as desigualdades sociais e o câncer do sistema prisional brasileiro. Para mudar, é imperativo sair da liberdade de indiferença e fazer valer o direito de intervir na história, esclarecer-se, votar, mudar, buscar, reinventar... Isto é liberdade! Jogar bombas e exterminar milhões de seres humanos é liberdade? Morar em castelos, enquanto muitos dormem ao sol e à chuva é liberdade? Usurpar o dinheiro e o direito público é liberdade? Neste dia, pensemos: Estou ou sou livre? Para quê e para quem? Liberdade tem a ver com ética? Estou fazendo jus ao meu livre-arbítrio? Somos livres para amar, pensar, lutar, e, sobretudo para buscar novas alternativas de existir: com respeito, dignidade e equidade. É um sonho possível!

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Suzy Maurício

Suzy Maurício

Psicóloga Clínica com atuação na cidade de Arapiraca

Postado em 04/07/2009 14:43

Luz para todos

A energia para mim é algo fantástico, a maior invenção do homem. Até os 6 anos de idade residindo em sítio, a única luz de que me lembro é a do candeeiro (espalhados pela casa), feitos de zincos, tipo uma caneca e que havia um bico de onde saía aquele fio de algodão que mergulhado no combustível era aceso.

Parecia magia, exalava um cheiro, a luz chegava e a fumaça desenhava as paredes,deixando-as negras, manchadas. Lembro de uma espécie de lamparina que funcionava a gás e era pendurada no telhado, iluminava bem mais, mas só havia uma.

Na primeira infância visitávamos a cidade e nos chamavam à atenção as lâmpadas incandescentes e de todos os tamanhos, os postes, árvores de natal piscando, roda-gigante, etc. Às vezes, à noite, desafiávamos a escuridão e brincávamos em cima da velha camionete CD 10 amarela, no alpendre de casa.

No Cariri, dormíamos ao escurecer, e somente nas noites de lua cheia era feita uma enorme fogueira, colocávamos “tamboretes”, cadeiras de balanço e lá nosso pai lia alguns livros, revistas, contava histórias bíblicas e “causos” das suas aventuras na mata, suas caçadas.
Ao menos a luz cognitiva chegava até o nosso lugar, nas palavras daquele que pouco foi à escola, mas que possuía uma relação íntima com a leitura, apesar de exercer a profissão de comerciante e lidar com animais, algodão, mamona, castanha, milho e feijão.

As notícias chegavam através do rádio, ligado às 5 da matina quando íamos ao curral tomar o leite da teta da vaca, quentinho. A TV só veio quando da mudança para a “cidade” em busca do ingresso escolar, aparelho preto e branco, botões enormes, e nós hipnotizados diante dela. Muitos ainda vivem à luz do velho candeeiro, três décadas passaram e a luz elétrica só chegou ao nosso sítio há um pouco mais de 3 anos, através do Programa Luz Para Todos do Governos Federal, implantado no governo Lula.

Em pequenos povoados a TV é comunitária e o filme visto em praça pública e reúnem humildes moradores: idosos, jovens e crianças de olho brilhante na telinha que mais parece sonho, conhecendo outros lugares e modos de vida jamais imaginados, alimentando sonhos e os impulsionando a olhar o mundo em outra direção, muito além da roça que a chuva traga ou que o sol e a seca não a deixa germinar.

Olhar aquém do velho fogão à lenha, da casa de barro, da água de pote, a água que é outro drama, do nordestino em particular. Não existe água encanada, o açude pode estar a muitos quilômetros dali, ou se perto a água é barrenta, retirada com dificuldade e dividida entre gente e animal, numa disputa que mais lembra a busca do ouro na Serra Talhada.

O Ministro da Minas e Energia, Edison Lobão, chega hoje, 03.07.09, à Arapiraca para inaugurar uma subestação de energia elétrica de 230 KV que se dá mediante esforços do Senador por Alagoas, Renan Calheiros e o Presidente da AMA- Associação dos Municípios Alagoanos e atual gestor municipal da cidade em seu segundo mandato.

No Planalto Central, se reuniram por duas vezes para viabilizar este momento, que na verdade é um pontapé inicial, tendo a quantidade energética aumentada lá para 2011, numa outra etapa de instalação. Um avanço para o Agreste!

Meu pai partiu antes da chegada da luz nas terras que tanto trabalhou para comprar, porém não teve a visão dos fios e postes luminosos rasgando a velha estrada de barro, rumo à civilização.
Meu passo não chega até lá, o coração aperta e adio mais uma vez. Os demais cuidam do nosso lugar. Esperei tanto a luz, mas não fui lá ver esta realização concreta. Talvez deseje encontrar aquela velha fogueira, a luz incandescente dos textos e meu pai por lá.

De repente será melhor guardar aquela velha imagem dos pastos verdes e do gado livre, dos carros de boi, da mandioca que produz farinha, na casa de farinha do meu avô, o imenso pilão, a concha de côco e o inesquecível gosto do feijão (somente com sal) da panela de barro, do fogão à lenha da comadre Jerusa.

Quem sabe um dia, ao lado dos cantadores de viola, não faça uma moda, uma poesia, e cantaremos parafraseando o poeta “só deixo o meu Cariri, no último pau-de-arara...” Ele vai sempre existir no peito nosso, a festa e a moda, faremos quando a água encanada chegar por lá. Vou lá ver o Ministro, agradecer ao Senador e ao Prefeito, e lembrar que a água também tem de chegar!

 

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